segunda-feira, 8 de novembro de 2004

Mobília

Cansada.
De ser tratada como mobília.
Cansada de ser mesa,
cadeira, cama.
Micro-ondas, master-chef.
Objectos que se usam
por vezes abusam
se põem de lado
sem um obrigado.

Cabeceira, almofada.
Nem bom dia
nem boa noite
nem nada.
Ainda sou gente
mas parece-me
que devagarinho
vou virando
comando
de televisão.

Fogão, panela,
menos que uma janela
porque essa
ainda serve para olhar.

Que sentirá o meu colchão
quando caio com todo o meu peso
cansado
e adormeço de seguida
levantar de madrugada
sem bom dia nem nada.

Não me vou esquecer
de passar uma mão
suave, talvez carinhosa
pelas costas da cadeira
pelo braço do sofá
pela almofada que me ampara o sono
sem resposta.
Agora que sei o que é ser mobília
não vou esquecer
de dizer olá, adeus
e agradecer.

Tudo o que quero e não ouço.

quarta-feira, 3 de novembro de 2004

Sorrisos e Lágrimas

É-me pedido que sorria
embora tenha a mágoa na alma.
É-me pedido que siga o meu caminho
e ignore o caminho de quem
deveria seguir ao meu lado.

É-me pedido que me esforce
embora o esforço
não seja reconhecido.
É-me pedido espaço
quando o espaço vazio
(tão vazio!)
à minha volta
me mete medo.

É-me pedido que espere
sozinha e com um sorriso
embora não saiba
onde está aquele por quem espero.

É-me pedido que me afaste
que enterre a cabeça na areia
e faça de conta
que nada se passa
embora saiba pelos silêncios
que (quase) tudo me é ocultado.

É-me pedido que não pergunte
embora as perguntas sem resposta
me encham a alma de terror.

É-me pedido que finja
que tudo vai bem
quando choro por dentro
a dor de não me sentir desejada.

É essa dor que me acompanha
dia e noite
embora para mim
pareça sempre ser noite
tal é a escuridão que me rodeia.

E no meio dessa dor
que querem que mantenha escondida
vou tentando sorrir, como me pedes.
Mas se olhares com atenção
por trás do meu sorriso
verás as marcas das minhas lágrimas.

terça-feira, 2 de novembro de 2004

M

Um testemunho de amizade. De fé na força que esta pessoa especial "M" tem no seu interior.


Triste, tão triste
porque tudo acabou
antes de começar...

Não, não vou
dizer-te para não chorar.
Chora, grita, esperneia
faz o que der na gana
solta a tua frustração
não a descarregues
sobre ti.

Não, não vou permitir
que te acuses, te imoles
no fogo da tua dor.
Sente-a, porque tens
que a sentir.
Afaga-a, porque provém
do teu coração.
E por fim afasta-a
antes que te devore.

Dá tempo ao tempo
esse grande feiticeiro
que tudo cura, tudo sara
ainda que te pareça
que não vai passar.

Dá tempo ao tempo
e tempo ao teu coração
para voltar a rir.

Um coração tão grande
como o teu
não merece ficar sozinho.