terça-feira, 27 de outubro de 2015

Abrir jogo - I

Teoricamente, isto devia ser algo super-fácil. Mesmo! Muito fácil para quem, ainda por cima, tem experiência prévia. Mas não é bem assim.

"Quem não arrisca, não petisca!", "Quem não pede, passa fome" e outras frases do género declaram o que parece ser uma verdade de La Palice: se não tentarmos alcançar o que queremos, é muito provável que não venhamos a obtê-lo. Isto é trigo limpo, farinha amparo, se estivermos a falar de coisas como ganhar na Lotaria ou conseguir acesso a um curso, por exemplo.

É tudo muito bonito mas existe o reverso da medalha (claro!!!).

"Quem anda à chuva, molha-se", que é como quem diz, quando alguém se expõe, arrisca-se a que algo (ou tudo, numa bela demonstração da Lei de Murphy) corra muito mal e o resultado seja custoso. E quando o que está em causa são sentimentos... o "mal" passa a "terrivelmente mal" e "custoso" transforma-se em "francamente doloroso".

Traduzindo em miúdos: quando corre mal, dói p'ra catano.

É que, quando admitimos perante nós próprios e perante os outros que temos 'um afecto muito grande' por alguém, expomo-nos substancialmente. Ficamos desprotegidos, abrimos o flanco para quem quiser atirar lança ou pedra.
E como é quando abrimos o jogo, expomos o coração e o sentimento a quem é o objecto desse afecto? Altera-nos de imediato o ritmo cardíaco. O coração fica apertado, cada batida em esforço como se o sangue fosse pastoso. É a antecipação, o momento de maior perigo. E dói, esta vulnerabilidade, esta entrega, este depositar do sentimento nas mãos de alguém que não sabemos como irá reagir.

Quando essa reacção é positiva é como ganhar uma corrida, ver o nascer do dia seja a que horas for, uma aurora de bonança saudada por inúmeros arco-íris de uma chuva que acabou de partir.

Quando é negativa... mesmo que já a esperemos, custa, custa sempre.
Pode ser como se o chão desabasse e nos sentíssemos cair sem controlo, incapazes de saber o que acontece a seguir ou se vamos sequer sobreviver ao embate.
Pode ser como um corte de papel, daqueles que a maioria das pessoas nem vê, de tão pequeno que é. Mas quem o tem na carne sabe bem onde está e a dor que causa.
O efeito pode ser grande ou pequeno, mas nunca, nunca ficamos incólumes, nunca ficamos como se nada tivesse acontecido. Quem disser que não sentiu nada ao ver os seus sentimentos rejeitados, na realidade nunca amou sequer.

É por isto que custa abrir o jogo - mesmo tendo a noção de que, se não o fizermos, não alcançaremos nada pois ninguém o fará por nós.
O que queremos afinal?

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